Message in a bottle

Faz tempo que não visito o campinho da vó.
Depois que a vó faleceu, a casa de madeira junto ao campinho foi alugada.
O campinho continua no mesmo lugar, em frente à casa dos meus pais, na cidade onde nasci.
Mas eu me mudei.
Quando eu visito meus pais, eu posso olhar para o campinho, mas eu já não caminho mais sobre ele como fazia antes. Na verdade, já fazia muito tempo que eu não caminhava sobre ele, antes de eu me mudar, antes da vó falecer, já nem lembro mais quando foi a última vez... e a última vez provavelmente foi muito depois de já não ser mais um costume.
Eu tinha passado, desde minha adolescência, a andar pelas ruas de Frederico, em vez de no campinho. Chamava menos atenção, eu pensava.

Agora eu estou em um apartamento de um prédio no Calçadão de Santa Maria e eu caminho muito pouco pelas ruas daqui. É estranho, porque aqui meu anonimato é bem maior; mesmo assim, tenho menos coragem de vagar por aí sem rumo.
Não é por medo de me perder, pois talvez me perder é o que eu mais quero, sem necessariamente esperar me encontrar depois. Me perder seria bom. Seria libertador. Seria magnífico andar até cruzar um limiar sem perceber, e sem perceber adentrar um outro plano.
Acho que meu medo é justamente andar e andar e voltar para o mesmo lugar, a mesma existência de sempre. De sempre? Do sempre que eu conheço, pelo menos.

(Eu tinha esquecido da sensação de escrever livremente!, quase sem cuidar o que sai da ponta dos meus dedos até a tela do computador. Será que alguém vai ler? Acho que eu gostaria disso, mas não quero compartilhar, fazer publicidade. Seria agradável se alguém inadvertidamente topasse com esse texto em algum momento, meio sem querer. Mesmo que eu não soubesse disso. Mas eu gostaria de saber. Acho que tem alguma coisa que une duas almas, uma que escreve e uma que lê, mesmo que elas não se encontrem pessoalmente. Ainda assim é um encontro, em algum plano. As palavras que eu agora escreve serão lançadas nessa rede gigantesca, que eu imagino como se fosse uma espécie de éter onde as coisas se espalham, mas onde podem ser encontradas com as palavras certas; e talvez alguém sintonizará esse canal e isso será como se estivéssemos de mãos dadas por alguns instantes.)

(Outra sensação muito legal é olhar o texto na tela sem recuo, sem justificar, sem adequá-lo às normas da ABNT. Dá-me uma alegria perversa ver o texto assim, todo torto. Talvez não seja tão atraente aos olhos, mas só de pensar que não haverá nenhuma censura quanto a isso... sinto um prazer inexplicável. Pode ser algum tipo de loucura, e talvez seja até meio infundada, já que quem sabe nem seja algo tão subversivo assim. Quer dizer, eu poderia propositalmente emprestar muito mais caos à forma desses parágrafos... Mas tem algo ainda mais satisfatório na amenidade dessa subversão. É uma pequena grande alegria. Não sei se isso faz sentido. Mas nem precisa fazer.)

Que tipo de texto é esse, afinal? Eu não sei, mas está sendo bom escrevê-lo, e é justamente o que vim fazer aqui. Eu não sabia quando comecei, por exemplo, que estaria me indagando isso agora. O rumo que tomou foi totalmente inesperado. É mais ou menos como minha cabeça funciona. Mesmo que às vezes eu pare um pouco para pensar em como continuar. Mas como não há uma preocupação com o efeito geral e eu não necessariamente tomo cuidado com o que veio antes... Ah! Cansei desse raciocínio. É por aí, e isso é suficiente.

Eu queria escrever por muito mais tempo, assim como gostaria de andar até me perder de mim e não me encontrar mais. Mas eu preciso suspender a escrita agora, porque a realidade (eu não queria chamar de realidade, porque não é bem isso, mas quero, ou antes preciso, terminar esse parágrafo logo e não me veio outra palavra melhor - atualidade talvez? Mundo material? Alguma coisa assim) me chama e diz que logo será preciso que o jantar esteja pronto. E serei eu a prepará-lo. Portanto, tenho que me despedir.

Presumo que eu deveria concluir com uma retomada do primeiro parágrafo, concatenando tudo o que foi escrito depois para que exista uma coesão na mensagem que está sendo expressa. Mas o que deveria ser feito não me importa. Então, por enquanto, é isso.

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